Desfazendo Falsidades de Pretensos Mitos Sobre Agricultura Biológica

Desfazendo Falsidades de Pretensos Mitos Sobre Agricultura Biológica

Autoria, pelo Forum Agricultura Biológica: Jorge Ferreira – ; António Mantas – ; José Amorim – ; José Carlos Marques –

Comentário crítico ao artigo do Jornal Público de 4-6-2023, assinado por Teresa Silveira:

– “Comer biológico é uma decisão não uma recomendação de saúde.” (Título da notícia).

– “A Agricultura Biológica ‘preserva os recursos naturais’ e baseia-se em ‘princípios de sustentabilidade e comércio justo’, mas os alimentos biológicos não são mais nutritivos. Nem evitam doenças.” (Sub-título).

Em artigo de Teresa Silveira inserido no jornal Público de 4 de junho corrente, desde logo criticável devido ao enviesamento dos títulos e subtítulos utilizados (“Os alimentos biológicos estão na moda, mas muito não passa de um mito” e “Comer biológico é uma decisão não uma recomendação de saúde”, ou ainda “os alimentos biológicos não são mais nutritivos. Nem evitam doenças”), são referidas várias questões importantes relacionadas com os produtos biológicos, comparando-os com os produtos convencionais – como a diferença dos preços, os apoios aos produtores, as diferenças nutritivas, os resíduos de pesticidas e outras vertentes concernentes a segurança alimentar, pegada ambiental, uso do solo e incidências sobre a sociedade e as comunidades.

As questões abordadas são todas elas reveladoras de diferenciação marcante entre produtos biológicos e produtos convencionais. Lamentavelmente, o artigo mistura conceitos, compara o que não é comparável e apresenta até falta de conhecimento do que é a agricultura biológica e dos seus aspetos mais elementares.

No entanto, consideramos que o mais determinante para o consumidor, e no artigo alvo de informação deficiente e claramente insuficiente, é aquele relativo aos resíduos de pesticidas nos alimentos, pelo que solicitamos a publicação do presente esclarecimento pelo que apresentamos este contributo a uma reflexão de que ressalte a verdade dos factos, e que dê o devido relevo ao efeito desses resíduos no ambiente, no homem e nas outras espécies, o que o artigo não aborda. Fazemo-lo indicando no final alguns artigos científicos, simples amostra das numerosas fontes existentes.

Assim, indicando os artigos científicos que consideramos como fontes, salientamos:

Ao contrário do que é referido no artigo, há evidências científicas de que os alimentos de agricultura biológica têm um impacto positivo na saúde, seja pelo que contêm de componentes nutritivos, seja pela ausência ou muito menor presença de resíduos de pesticidas e de metais pesados. Da presença ou ausência de resíduos de pesticidas nos alimentos, resulta uma notável e significativa diferença em termos de impacto na saúde humana.

Exemplifique-se com a publicação científica de meta-análise de Vigar V. et al (2019); alguns dos 35 estudos nela considerados mostram que o aumento de alimentos biológicos no regime alimentar faz reduzir a incidência das doenças crónicas seguintes: infertilidade; deformações congénitas (à nascença); sensibilidade alergénica; otites; pré-eclâmpsia; síndrome metabólico com obesidade abdominal, com maior risco de doença cardiovascular (ataque cardíaco e AVC) e diabetes; obesidade com alto BMI (Body Mass Index); cancro linfoma de não-Hodgkin.

A maioria desses 35 estudos mostram uma menor exposição dos consumidores a pesticidas quanto maior o consumo de alimentos biológicos. Outro facto merecedor de consideração: a União Europeia (UE) é considerada a região do Mundo com maiores restrições aos pesticidas agrícolas.

No entanto, em 2022, das 450 substâncias ativas autorizadas na agricultura convencional (a que correspondem muitos mais produtos comerciais homologados em cada Estado-membro), 57 dessas substâncias ativas são classificadas como sendo de alto risco para a saúde humana (hazardous pesticides).

Com base noutro estudo de meta-análise (Instituto francês INSERM, Arnold T. & Tilton 2021), a Comissão Europeia (CE) indica que existe uma forte probabilidade de uma ligação causa-efeito entre a exposição a pesticidas e seis importantes doenças crónicas: linfoma de não-Hodgkin; mieloma múltiplo; cancro da próstata; doença de Parkinson e outras do foro neurológico; doença pulmonária obstrutiva crónica; bronquite crónica, para além de outras doenças crónicas.

Por outro lado, a CE, na sua Estratégia “From Farm to Fork: Our food, our Health, our planet, our future” (CE, 2021), traduzida para português como “Estratégia do Prado ao Prato”, tem como três dos seus seis objetivos quantificados os seguintes, até 2030: reduzir em 50% o uso e o risco dos pesticidas químicos; reduzir em 50% o uso dos pesticidas mais tóxicos e de maior risco (the more hazardous pesticides); aumentar a agricultura biológica / Organic farming as an environmental-friendly practice (Ferreira J., 2021) para 25% da superfície agrícola da UE.

Está igualmente bem documentado que os efeitos crónicos dos pesticidas na saúde humana podem ocorrer mesmo quando o teor de resíduos no alimento se encontre abaixo do limite máximo de resíduos legal (LMR), já que os estudos relativos ao produto comercial, que estão na base da homologação fitossanitária, têm uma duração de três meses em ratos-cobaia de laboratório, os quais têm uma vida média de dois anos, duração insuficiente para avaliar se o pesticida provoca um cancro ou outra doença crónica no animal.

Quanto aos pesticidas com efeito disruptor endócrino (desregulador hormonal), podem ter esse efeito mesmo em doses e concentrações muito baixas. Ora, neste tipo de efeito na saúde, não é a dose que faz o veneno, como foi demonstrado cientificamente há mais de vinte anos, pondo ainda mais em causa a segurança atribuída aos LMR.

A agricultura biológica atual, regulamentada na UE por igual para todos os Estados-membros desde 1991, e com os regulamentos atualmente em vigor (Reg. UE 2018/848 para a agricultura biológica em geral e Regulamento de execução UE 2021/1165 para os pesticidas), cumpre a cem por cento o primeiro objetivo da estratégia acima referida, já que não permite pesticidas químicos de síntese (exceto duas substâncias ativas, a deltametrina e a lambda-cialotrina, mas apenas no interior de armadilhas para captura massiva de pragas, sem contacto direto com a planta), e também praticamente a cem por cento o segundo objetivo, já que os biopesticidas (de origem vegetal, ou microbianos) e os pesticidas minerais à base de enxofre, cobre, ou hidrogenocarbonato de potássio, são de baixo risco para a saúde humana, com uma limitação quantitativa ao uso de fungicidas de cobre (4 Kg/hectare/ano) de maneira a evitar poluição ambiental, e que é igual à limitação existente em toda a agricultura.

Estudos citados:

  • Arnold T. & Tilton R., 2021. Pesticides and effects on health; New data. INSERM-French National Institut of Health and Medical Research;
  • EC, 2020. From Farm to Fork: Our food, our Health, our planet, our future;
  • EC, 2022.Comission Staff Working Document. Impact Assessment Report. Accompanying the document: Proposal for a Regulation of the European Parliament and the Council on the sustainable use of plant protection products and amending Regulation (EU) 2021/2115;
  • Ferreira J. (Coord.) 2021. Boas práticas agrícolas para o solo e para o clima. Agrobook, Porto;
  • Vigar V., Myers S., Oliver C., Arellano J., Robinson S., & Leifert C., 2019. A Systematic Review of Organic Versus Conventional Food Consumption: Is there a Measurable Benefit on Human Health? Nutrients 2020, 12, 7.

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