Agricultura Biológica – Conceitos, princípios, fundamentos e práticas
A agricultura biológica é também designada por agricultura orgânica (organic farming), agricultura ecológica, sendo estas as três designação aprovadas oficialmente na União Europeia e que têm o mesmo significado, de acordo com a legislação comunitária em vigor para a produção, transformação e comercialização de produções agrícolas vegetais e animais, ambos em vigor com as mesmas regras para todos os países da UE.
- Regulamento (CE) nº 834/2007, do Conselho, de 28 de Junho;
- Regulamento (CE) nº 889/2008, da Comissão, de 5 de Setembro;
- Regulamento (UE) nº 848/2018, do Parlamento Europeu e do Conselho;
- Regulamento de execução (UE) nº 1584/2018, da Comissão.
No Japão é também usado o nome de agricultura natural (nature farming) .
Existem ainda métodos particulares de agricultura biológica, como é o caso da agricultura biodinâmica, ainda mais exigente que a biológica, em particular no seguimento dum calendário de sementeiras e plantações, na aplicação de preparados biodinâmicos para activar a compostagem, e fortificar o solo e as plantas, na necessidade de criação animal dentro duma exploração de produção vegetal, e na redução do uso de cobre como fungicida.
Esta produção certificada como “biológica” e “biodinâmica” tem um mercado próprio, em especial na Alemanha, Áustria e Suiça.
A agricultura biológica é considerada como um modo de agricultura sustentável e “alternativa” à agricultura dita “convencional”. É mesmo considerado o modo de produção que mais longe vai e melhor atinge os objectivos duma agricultura sustentável (ambiental, económica e socialmente), muito mais exigente que a produção integrada, e que deve ser no médio e longo prazo o caminho a seguir pela maioria dos agricultores, desde que melhorias técnicas e económicas sejam feitas.
É um sistema de produção que evita ou exclui a quase totalidade de produtos químicos de síntese como adubos, pesticidas, reguladores de crescimento e aditivos alimentares para animais.
É também o único modo de produção agrícola que proibe a utilização de organismos geneticamente modificados (ogm’s), sejam plantas cultivadas (sementes), animais de criação ou microrganimos para protecção fitossanitária. No caso de ocorrer uma contaminação acidental (por polinização cruzada a partir duma cultura transgénica próxima, ou por mistura em armazém) a certificação é retirada.
Para que seja praticável na máxima extensão, os sistemas de agricultura biológica recorrem a rotações culturais, resíduos das culturas, estrumes de animais de pecuária biológica, leguminosas fixadoras de azoto, adubos verdes, todos os resíduos orgânicos da exploração agrícola, incremento da limitação natural de pragas pelos organismos auxiliares, luta biológica (largadas de insectos e ácaros auxiliares) contra pragas e doenças e outras práticas culturais, de modo a manter e aumentar a produtividade do solo, a nutrir as plantas e a controlar insectos, ervas infestantes e outros inimigos das culturas.
Na fertilização das culturas e em complemento das práticas anteriores, são autorizados fertilizantes minerais e orgânicos de origem convencional mas não de síntese química.
Na protecção fitossanitária são autorizados, em reduzido número, pesticidas de origem vegetal (ex: azadiractina da planta Azadirachta indica) , mineral (ex: enxofre, cobre, sabão de potássio), ou microbiológica (ex: bactéria Bacillus thuringiensis para lagartas, vírus da granulose do bichado da maçã, spinosade). Não são autorizados herbicidas, recorrendo-se à monda mecânica, manual e térmica, à falsa sementeira, ao empalhamento (mulching ou paillage) e à solarização do solo.
A produção animal tem de estar ligada à terra, com acesso dos animais à pastagem e com uma densidade máxima de duas cabeças normais (equivalente a duas vacas adultas) por hectare.
O solo, tal como todo o agrossistema, é um sistema vivo e frágil, que deve ser respeitado e melhorado, evitando-se a sua contaminação, compactação e perda por erosão devida à chuva (hídrica) ou ao vento (eólica). O solo leva muitos tempo a formar-se a partir da rocha mãe do subsolo (cerca de 200 anos por cada centímetro de espessura!) e esse ganho que demorou 200 anos a ser fabricado pela natureza pode perder-se num só ano com chuvas mais intensas se nesse período das chuvas temos a terra lavrada ou com herbicida!
Mas essa erosão e lavagem do solo não acontece se tivermos erva ou empalhamento e uma boa estrutura e alto teor de matéria orgânica, que permita a infiltração da totalidade ou da maior parte da água da chuva.
O aumento de 1% (um ponto percentual) da matéria orgânica ou húmus num solo com 50cm de profundidade equivale a pelo menos 30 toneladas de carbono (C ) por hectare. Isto a não ser que haja muita pedra, uma vez que na análise só se considera a terra fina e não as pedras.
O aumento de 1% (um ponto percentual) da matéria orgânica é possível em 10 anos com boas práticas agrícolas. Se esse aumento fosse conseguido em todo o solo agrícola português (cerca de 3.500.000ha) então o sequestro de carbono (sem contar com as florestas) seria de 105 milhões de toneladas. Este é um valor muito superior ao que tem sido indicado como necessário para Portugal atingir a neutralidade carbónica. Desta forma a agricultura pode e deve fazer parte da solução e não do problema das alterações climáticas.
Não devemos esquecer de que quem produz matéria orgânica são as plantas e não os animais. Pela fotossíntese as plantas captam carbono mineral (CO2 na forma gasosa) do ar pelas folhas e transformam-no em hidratos de carbono. Já o animal para produzir orgânico (caso dos estrumes) tem de consumir orgânico (plantas ou outros animais).
A parte da planta que não é colhida, desde que fique no solo e não seja queimada, converte-se gradualmente em húmus, numa taxa que geralmente varia entre 0,10 e 0,15. Isto quer dizer que 10 a 15% da planta seca (descontando a água que ela possa conter) vai transformar-se pela ação dos organismos do solo (principalmente as minhocas, os insetos decompositores como os colêmbolos, os fungos, as bactérias, e os actinomicetas), em matéria orgânica humificada ou húmus, que contém cerca de 58% de carbono. Este carbono é estável e resiste ao fogo. E o carbono do solo a nível mundial, é mais do que o das árvores das florestas.
Exemplo: milho-grão (raiz e toda a palha deixadas no terreno):
– Matéria seca = 6.000Kg/ha x 0,15 = 900Kg/ha de húmus formado no solo = 520 Kg de carbono orgânico.
Certificação e mercado
O forte crescimento da agricultura biológica nos últimos anos, tem sido devido principalmente ao deselvolvimento do mercado europeu (Centro e Norte da Europa) e mundial (Estados Unidos, Japão). A exportação para os principais mercados exteriores à União Europeia obriga ao cumprimento e certificação de normas adicionais desses países para além das normas comunitárias seguidas pelos produtores da UE.
Os produtos de agricultura biológica só podem ser comercializados como tal, desde que controlados e certificados por organismos de certificação aprovados e acreditados, que no caso português são privados, aprovados pelo Ministério da Agricultura (Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural) e acreditados pelo Ministério da Economia (Instituto Português de Acreditação).
O produto é embalado e rotulado com a indicação do modo de produção (Agricultura biológica) do organismo de certificação e com o símbolo comunitário que a partir de 2010 tem novo formato e passa a ter uso obrigatório em produtos biológicos da UE.
A maior feira/exposição de produtos “biológicos” (leia-se “de agricultura biológica”), denominada BIOFACH, realiza-se anualmente em Nuremberga, Alemanha, no mês de Fevereiro.
A nível mundial os princípios, as práticas e as normas da agricultura biológica são discutidos e definidos pela Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Biológica (IFOAM – International Federation of Organic Agriculture Movements), organismo da qual a AGRO-SANUS é membro efectivo (IFOAM member).